Referência Industrial

#tbt: Entrevista com Junior Ruiz Garcia

Confira a entrevista da REFERÊNCIA INDUSTRIAL edição 231, no nosso “#tbt”

JUNIOR RUIZ GARCIA

Cargo: Professor do Departamento de Economia UFPR (Universidade Federal do Paraná), coordenador do Grupo de Estudos em MacroEconomia Ecológica (GEMAECO) e integrante do Núcleo de Estudos em Economia Social e Demografia Econômica (NESDE)

Formação: Bacharel em Ciências Econômicas pela UFPR e doutor em Desenvolvimento Econômico Espaço e Meio Ambiente pelo Instituto de Economia da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas)

Altos e baixos

Em um ano ainda marcado pela pandemia da Covid-19, o Brasil segue em cenário incerto para sua economia. Mesmo com uma projeção positiva para o PIB (Produto Interno Bruto), diversas variáveis podem colocar em risco essas estimativas.

“Os empresários devem acompanhar a dinâmica da pandemia para definir suas estratégias para o segundo semestre. Outro elemento tem sido a reversão da política monetária, que iniciou um processo de elevação da taxa de juros básica da economia brasileira, a SELIC”, explica o professor do Departamento de Economia da UFPR, Junior Ruiz Garcia.

O especialista conversou com exclusividade à Revista Referência Industrial e abaixo segue a entrevista na íntegra:

1- Quais são os principais fatores que devem pautar o mercado nesse segundo semestre e necessitam maior atenção dos empresários?

Como a pandemia ainda não foi controlada no Brasil, devemos acompanhar a dinâmica dos novos casos e, obviamente, a evolução da vacinação. Apesar da vacinação, como não temos adotado as medidas recomendadas desde o início da pandemia, podemos enfrentar situação similar a observada no Chile e no Uruguai.

Estes países avançaram rapidamente na vacinação, mas relaxaram a retomada das atividades de maneira precoce, agora estão enfrentando uma alta no número de novos casos. Em resumo, sem o controle da infecção por Covid-19 continuaremos sofrendo seus efeitos na dinâmica econômica.

Desse modo, os empresários devem acompanhar a dinâmica da pandemia para definir suas estratégias para o segundo semestre.

Outro elemento tem sido a reversão da política monetária, que iniciou um processo de elevação da taxa de juros básica da economia brasileira, a SELIC. A elevação da taxa de juros pode afetar negativamente as decisões de consumo, produção e investimento.

É uma situação paradoxal, porque já o consumo, produção e investimento têm sido afetado negativamente pela pandemia. Apesar disso, a política monetária tem objetivo controlar a inflação com base na taxa de juros básica da economia.

Por fim, a inflação deve ser considerada pelos empresários. Como estamos em um momento de grave crise econômica a inflação pode afetar de maneira significativa os preços relativos da economia, isso porque apenas os setores com poder mercado conseguirão manter suas margens de lucros.

O restante dos setores não consegue repassar plenamente os efeitos da inflação em sua estrutura de custos para os preços de seus bens e serviços. Isso afetará a capacidade futura das empresas para realizar adequações quando superarmos a pandemia e tivermos a retomada do consumo e da produção.

 2- Após um início turbulento pela pandemia, a expectativa de diversas instituições do mercado é de crescimento para o PIB nacional neste ano. Você acompanha esse otimismo e quais os motivos que explicam essa retomada?

É preciso ter cuidado. Na prática não temos crescimento econômico (do PIB), porque ainda estamos abaixo do nível anterior ao início da crise. Desse modo, o que temos é apenas variação positiva ou negativa do PIB. No último trimestre tivemos uma variação positiva no PIB. Mas isso ocorreu em grande medida pelo excepcional desempenho do agronegócio, não necessariamente por uma recuperação das atividades econômicas. Além disso, estávamos vindo de um ano extremamente complicado, com queda significativa do PIB.

Dito isso, para o segundo semestre é possível que tenhamos variações positivas no PIB, especialmente pela continuidade do desempenho do agronegócio, além da recuperação de algumas atividades que possam ser beneficiadas pelo avanço da vacinação. Isso significa que um melhor desempenho do PIB depende diretamente do controle da infecção da Covid-19 no Brasil.

Mas como observado acima, existe a possibilidade de seguirmos a trajetória do Chile e do Uruguai, o que poderia minar esta variação positiva do PIB no segundo semestre. Se tivermos uma retomada no aumento no número de novos casos de infecção por COVID-19, não haverá outra alternativa que não seja o fechamento das atividades econômicas não-essenciais. E aí, a variação positiva do PIB estará seriamente comprometida. Desse modo, a sociedade deveria levar mais sério o cenário da pandemia neste momento e adotar medidas agora, na tentativa de amenizar seus efeitos no segundo semestre. Contudo, não acredito que façamos isso e podemos realmente sofrer novamente uma forte retomada das medidas de enfrentamento da pandemia, com fechamento das atividades não-essenciais.

 3- Nas últimas semanas o dólar tem apresentado ligeira queda e voltou a ser cotado abaixo dos R$ 5. Essa é uma tendência para o segundo semestre e como você avalia essa variação?

Avaliar a dinâmica cambial não é uma tarefa fácil. Mas com o aumento da taxa de juros básica da economia, dos saldos comerciais proporcionados pelo agronegócio e a expectativa de variação positiva do PIB, o câmbio pode permanecer muito próximo a R$5 para o segundo semestre. Mesmo que tenhamos um agravamento da pandemia, não é muito factível retornamos a R$6.

4- Na sua avaliação, quais medidas o Governo Federal deve tomar como prioritárias para conseguir auxiliar comércios e indústrias nesse segundo semestre?

O Governo Federal deveria ter mantido todas as medidas adotadas no início da pandemia até que fosse controlada a infecção e tivermos a retomada das atividades em sua plenitude e com segurança sanitária.

Desse modo, manter o apoio para a folha de pagamento, como redução da jornada com salário complementado com recursos públicos, extensão de prazos para pagamento de tributos ou empréstimos públicos sem custo adicional, renegociação de dívidas com aumento do período de carência (talvez carência enquanto tivermos restrições as atividades econômicas não-essenciais), redução ou isenção tributária, alguma medida para reduzir os custos associados aos imóveis alugados, entre outras de acordo com as especificidades de cada setor de atividade.

Cabe destacar que estas medidas devem ser adotadas preferencialmente para micro, pequenas e médias empresas vinculadas aos setores considerados não-essenciais.

5- Se você pudesse dar um conselho para os empresários nacionais neste momento, qual seria?

Faça pressão para que possamos acelerar a vacinação no país! Adicionalmente, faça campanhas para que seus colaboradores e consumidores respeitem as medidas de enfrentamento da pandemia, como distanciamento físico, evite aglomerações, use máscara de qualidade entre outras. Sem controlar a contaminação da Covid-19 não teremos um ambiente tranquilo para a realização das atividades e, obviamente, para a tomada de decisão. Como disse acima, existe um risco de seguirmos a trajetória do Chile e do Uruguai, isso será péssimo para a sociedade brasileira e, claro, para os empresários.

Entrevista da REFERÊNCIA INDUSTRIAL, edição 231.

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